KING THE LAND: FELICIDADE É UM LUGAR

 



Começar a assistir dramas coreanos pode se tornar um caminho sem volta. E ainda bem que é assim. Porque assistir essas obras e tentar entender de onde elas veem parece uma missão mais do que especial. E só assistir por assistir também…


Recentemente eu vi uma entrevista do Miguel Falabella, em que ele disse que assiste dramas coreanos, e isso foi divertido porque pareceu chocar muita gente nos comentários do vídeo. Eu fiquei em paz, assoprei a fumaça do meu chá para longe e dei uma risadinha enquanto degustava o sabor de matte com limão siciliano.


Miguel Falabella é um ator, diretor e roteirista brasileiro, e você sabe disso, porque você já viu ele em algum lugar da televisão ou do teatro. E por ser uma figura tão marcante e importante da nossa cultura, parece insano imaginar que ele assista “novelas coreanas” - como ele mesmo chamou. Mas não deveria ser um susto.


Como todo bom pensador, ele é o tipo de pessoa que lê, estuda, assiste, ouve, participa e aprende sobre tudo que for disponibilizado para ele. Se tiver como acessar, ele vai consumir aquilo e tirar suas próprias conclusões. E vai, de forma boa ou não, opinar, se inspirar e debater sobre. E é assim que nascem os gênios…


Ok, mas aí você se pergunta: “o que isso tem a ver com os dramas em si ou com o tema de hoje?”


TODO MUNDO ESTUDA MESMO?


O argumento de Miguel Falabella para consumir o material coreano é que, nos enredos, todos precisam manter seus estudos em dia ou vão sofrer por isso. Que as mocinhas, os galãs e os vilões precisam estudar porque foi assim que se tornaram um país.


Pensa no impacto de escutar isso de uma das maiores figuras da cultura e da comunicação nacional, levando sempre em consideração o cenário político atual? E isso não é uma discussão sobre direita, centro e esquerda. Isso é um pensamento lógico. Porque, se você quer seguir essa ou aquela política, você precisa estudar.


Mas, de uma forma geral, a ideia é: um país se constrói estudando, aprendendo sobre sua própria história, sobre suas raízes, sobre seu povo e sobre sua cultura. Em um país como o Brasil, isso se torna ainda mais importante, afinal: a nossa pluralidade nos torna um dos países mais fortes do mundo. Culturalmente falando, nós temos um pouco de tudo no nosso contexto pessoal.


Temos culturas de países africanos, europeus e asiáticos. Também unimos culturas de outros países que já foram colônias, como nossos vizinhos da América Latina que têm suas próprias culturas pré

colonialismo. Fora as nossas próprias influências pessoais sobre os nativos que estavam aqui antes de Portugal chegar. Estudar transforma um povo em um país. Pensar nisso nos faz levar a interpretação para outros patamares…


Afinal, se estudar é o que transforma um povo em um país: o que transforma um ser humano em um indivíduo?


Se pensarmos em Simone de Beauvoir, podemos parafrasear sua mais célebre percepção sobre o feminino: não se nasce mulher, se torna mulher. Porque nascer com um sexo - ou transiocionar para ele - não quer dizer nada. Nós somos seres de camadas, e nos construímos com estudos, experiências, convívios e memórias.


Quando assistimos dramas coreanos e vemos todo mundo estudar, estamos vendo a construção de pessoas. Estamos aprendendo sobre suas vivências e surgimentos de memórias. Como quando demonstramos a razão de uma criança não poder colocar o dedo na tomada.


E se é assim que construímos pessoas, países e mulheres, então também construímos lugares?


A CONSTRUÇÃO DE UM LUGAR


Se tudo é construído em nós como indivíduos e como civilização, então podemos entender que podemos construir coisas dentro de nós. Bem ao estilo das ilhas do filme “Divertidamente”.


A construção de um indivíduo, fora do âmbito social e político, demanda ainda mais atenção. Porque são as nossas experiências durante a primeira infância e infância que constroem o que somos e como vamos nos mostrar para o mundo.


Falando de forma bem ampla, temos a capacidade de criar, dentro de nós, referências que fazem sentido em alguns contextos, e isso nos leva até o ponto chave dessa observação: podemos ser lugares.


Recentemente, na terapia, entendi que pessoas também são pontos de referência para o nosso emocional, e que essas são respostas práticas e automáticas. Como lugares.


Para dar um exemplo bem claro da coisa e aleatório: se você gosta muito de São Paulo e se sente feliz lá, quando tiver que pisar na cidade ou falar sobre, sua memória afetiva vai acionar o sentimento de felicidade de forma instantânea. E é por isso que sempre completamos esse tipo de informação sobre nós dizendo coisas como: “nossa, eu amo estar lá”.


Quando pensamos de forma prática sobre as pessoas ao nosso redor, também concluímos isso… Em um exemplo bem pessoal: eu tenho uma amiga de anos, que passou todos os perrengues da minha vida de jovem adulta ao meu lado, e que tem seguido comigo até o ápice da minha vida adulta. Aos poucos, com a construção dessa nossa relação amistosa, meu cérebro passou a pensar nela como um ponto de referência de paz e alegria.


Todas as vezes que converso com ela, ou que penso e falo sobre ela, sinto de forma automática uma felicidade plena e uma grande paz de espírito. Não controlo isso, e registro essa informação com mais força a cada memória juntas que evoco. E por mais doloroso, triste ou irritante que tenha sido o meu dia, se a memória ou a pessoa dela surgir na minha cabeça, avanço diretamente para esse lugar feliz.


Essa amiga me traz a mesma sensação de estar com os pés descalços na grama fresca, e isso me catapulta para a ideia óbvio de que sim, pessoas são como lugares e se constroem em nós de formas diferentes do que se constroem em outras pessoas, porque são lugares diferentes dos nossos sentimentos afetivos.


E se você achou a metáfora ruim ou confusa, vamos pensar em nosso cérebro como uma máquina de construir lugares. E assim, uma máquina de construir pessoas sob a nossa visão pessoal também nasce.


KING THE LAND


No hotel que dá origem ao roteiro, a ideia principal de seu gestor é que aquele fosse um lugar feliz. Um lar para funcionários satisfeitos e clientes que voltam porque sentem coisas boas ao estar ali. Seguindo esse plano, a ideia principal do hotel é que todos os funcionários sorriam sempre, atendendo seus clientes com paciência e um belo sorriso simpático.


E mesmo que pareça óbvio que isso seja esperado de funcionários de hotéis, temos que pensar que: enquanto estamos em viagens de trabalho ou de férias, onde podemos olhar coisas novas e conhecer pessoas, para eles, aquele é só mais um dia de cansaço e perturbação, enquanto servem vontades de hóspedes que são bombas relógios em troca de poucas recompensas financeiras, que - em especial no caso desse drama -, não vão cobrir nem metade de uma diária desse lugar tão lúdico.


Dentro desse contexto, temos o protagonista, que é um dos herdeiros desse hotel que espera sempre funcionários sorridentes. E esse herdeiro odeia sorrisos. Ele despreza a lógica de sempre atender os hóspedes sorrindo, despreza a ideia de ser recebido com simpatias forçadas e não finge que gosta desse sistema de treinamento.


Até ele conhecer a protagonista. E é ela que ensina ele, não só a sorrir, mas também a entender que a vida é muito mais do que se ressentir e viver de traumas. E isso nos diz uma coisa muito clara: a felicidade é um lugar.


E esse lugar pode ser pessoas. Pode ser alguém que você viu se construir como indivíduo. Então, eu me pergunto: existe algo mais delicado e poético?


Temos que entender que ninguém é pilar de ninguém, não somos responsáveis pelas dores antecedentes das pessoas e não existe isso de “consertar” alguém. Mas podemos ver uma pessoa boa melhorar ainda mais e superar suas dores, e assim, construir com ela, um lugar seguro dentro dessa relação.


♥ Olive Marie

Postagens mais visitadas deste blog

SRTA. AUSTEN: AS MULHERES POR TRÁS DE LENDAS

GALATEA DAS ESFERAS: A FÓRMULA FEMININA DO SUCESSO

AS DUAS FRIDAS: A ARTE SOBRE MULHERES