MOONRISE KINGDOM: A LINGUAGEM JUVENIL

 




Me lembro, vividamente, de assistir as aventuras de “Peanuts” quando mais nova. Me lembro da minha mãe me contar que os adultos falavam em ruído porque queria dizer que as crianças não os entendiam… Por isso que a Lucy dava uma de psicóloga dos amigos.


“Moonrise Kingdom” segue o mesmo padrão.


Quando assisti ao filme pela primeira vez, no fim da minha adolescência, pensei em “Peanuts”: adultos agindo como crianças enquanto crianças agem como adultos. É como Charlie Brown que não entende os adultos ao seu redor.


Isso só possível porque Wes Anderson entendeu algo que Schulz tentou ensinar à todos muito antes: gerações têm dialetos. Funcionam em frequências completamente diferentes.


NOSTALGIA X REALIDADE


Em 2012, quando “Moonrise Kingdom” foi lançado, Anderson afirmou que a obra era sobre nostalgia. E faz sentido, mas em partes…


Wes Anderson nasceu em 1969, o que quer dizer que toda a sua infância aconteceu em 1970. “Moonrise Kingdom” apresenta Suzy e Sam como pré-adolescentes em 1965. A nostalgia deles não teria como ser a mesma, afinal, criador e criaturas teriam pouco mais de dez anos de diferença.


Se a nostalgia não é a mesma e a realidade se difere, qual a razão do conceito da obra fazer sentido em larga escala?


Simples! 


Faz sentido porque, enquanto criaturas tentam amadurecer e se descobrir bem no momento em que a vida se tornava psicodélica, criador resgata algo que provavelmente faz sentido em sua infância: consumir os anos 1960 enquanto se rebela contra 1950 e suas tradições padronizadas.


Aqui, nostalgia e realidade se misturam.  E se misturam com elegância. Reforçando a ideia de que infância, adolescência e maturidade falam idiomas diferentes. E não só por causa do desenvolvimento cerebral que segue evoluindo aos poucos até a fase adulta.


JAPONÊS - FRANCÊS - MONGOL


Há alguns anos, uma amiga me disse que sempre que via os filhos brincando, sentia que eles falavam em japonês. “Apesar de ser o mesmo idioma, eu não entendo nada”, foi o argumento. E mesmo sem ser mãe, eu entendi perfeitamente o que ela queria dizer.


Os filhos dela sempre vão ter uma diferença de 20 anos da mãe em tecnologia, momentos históricos, gírias e embasamento cultural. Só que tem mais… Ela nunca mais vai ser criança. Ela jamais entenderia a frequência deles, porque sua frequência é outra.


“Moonrise Kingdom” escancara isso sobre a adolescência. Afinal, adolescentes querem ser adultos, e tentam ser profundos. E enquanto tentam ser profundos, acham os adultos patéticos, tentam conversar “em poesia” e se tornam esnobes sobre o resto do mundo, ao se acharem chiques e inteligentes.


Só que adultos também estão tentando se adaptar e ser alguém, e entender seus próprios processos pessoais e tudo isso. Ser adulto é se sentir patético também, aceitar humilhações burras por sistemas políticos e entender processos complexos sobre si mesmo que tenta fingir que não entende. E adultos são mesmo infantis… 


Não existe um manual de instruções sobre como ser adulto. A gente apenas aprende como gostaria de ser na maturidade, clona uma concepção do que achamos certo e passamos o resto da vida agindo como crianças que fingem ser adultos.


Adulto premium é uma criação social. Nossos pais também não sabiam o que estavam fazendo, e ainda não sabem. Nossos avós muito menos! A diferença é que o “sonho americano da maturidade” era vendida para eles com mais rigidez, e aí eles acreditaram.


A questão é que adolescentes, talvez, se comuniquem em francês


E se assim é, nós, adultos, nos comunicamos em mongol.


O IMPÉRIO QUE JÁ FOMOS


Quando um adulto tenta reproduzir um adolescente que se comunica em profundidade forjadamente francesa, Jeferson Tenório faz uma garota de 16 anos dizer: “Não tenho medo da morte, voar é mais importante que morrer”.


Wes Anderson fez o mesmo: criou uma poesia francesa forjada para mostrar que a frequência jovem é outra.


Como mongóis (adultos), já fomos impérios fortes, uma grande monarquia emocional e nômade. Mas ser nômade antes nos fez encontrar lar na China ou na Sibéria. E agora nossa frequência é social, e não um estado de espírito.


Somos só a grande piada dos reinos consolidados. Só que temos tanto que nos preocupamos com outras coisas, que simplesmente não queremos entender a frequência de mais ninguém. Filosofar nossa nostalgia nos basta e nos cai bem.


E isso me faz questionar: a filosofia da linguagem jovem envelhece ou é abandonada? E, independente da resposta para essa pergunta: será que adultos são menos profundos ou será que profundidade é uma construção do que a arte passou séculos tentando nos vender?


Olive Marie ♥