O GUARDA-CHUVA AZUL: PAIXÕES PLATÔNICAS SENDO JOVEM
Há alguns anos, uma amiga me disse que fazer amizade na vida adulta é mais difícil. “Ou somos amigas de quem trabalha com a gente ou fazemos amizade no ônibus”, disse ela. E talvez o fato de eu não andar de ônibus seja o grande responsável por eu ter poucas amizades novas, mas a questão é que concordo com ela.
Em mesmo grau, há outra coisa que muda na vida adulta: como se conhecer pretendentes amorosos. Acho que tenho umas cinco amigas que começaram a namorar por causa de aplicativos de relacionamento; e isso me atordoa.
Há algum tempo eu li em algum lugar que os jovens de hoje são um saco porque eles não têm um ídolo teen de verdade por quem se apaixonar… Nunca ouvi duas verdades complementares em tão pouco tempo.
BIEBER, EFRON, STYLES, PATTINSON
Era fácil identificar o perfil romântico de uma garota, na minha época de adolescente, de acordo com a paixão platônica dela. Na verdade, dava até para adivinhar suas personalidades e seus futuros românticos de acordo com o crush.
E mesmo que essa fosse apenas mais uma coisa para eu me sentir fora do grupo, as paixões platônicas por ídolos teen canalizavam a chatice adolescente e ensinava uma ou outra coisa sobre paixão, expectativa e autoconhecimento. Também era uma forma de unir pessoas e ensinar sobre partilha.
Assumo que eram tempos mais simples e que quase ninguém surtava achando que ia casar com o seu respectivo sonho de consumo romântico, mas educava sobre amores platônicos e respeito próprio.
COMO SE AMA EM LINGUAGEM DE EMOJI
Recentemente li “Tudo o que eu sei sobre o amor” e fiquei apaixonada por uma observação que a autora faz sobre a época em que flertava pelo MSN. No trecho ela diz: “Era um cortejo vitoriano muito complicado e eu era uma participante afoita e disposta.”
Naquele início do século, nos primórdios dos anos 2000, começava a se ensaiar a paixão pelo meio digital, apesar de já ter relacionamentos por correspondência há séculos. Mas naquele tempo ainda havia a paixão platônica.
Revistas — como Capricho e Atrevida — ainda estimulavam a paixão platônica continuada, sessões de comportamento debatiam aspectos sociais e psicológicos com adolescentes e a juventude era descoberta no dia-a-dia.
Ainda como um reflexo infantil, minhas amigas se digladiavam para decidir quem era a cantora pop que mais representava nossa geração e porque queriam ser como essa ou aquela artista. De princesas da Disney, migramos para Taylor Swift, Katy Perry e Beyoncé. A revista Capricho tinha até um evento privado para quem “meninas normais” ficassem perto de seus ídolos nacionais e tivessem a ilusão de uma chance remota com os Colírios.
Hoje em dia as coisas parecem mais complicadas… Se um carinha que te interessou não te corresponde, tu descobre isso de um jeito humilhante: ele empurra tua melhor foto para um canto da dela. A chance romântica de ser humilhada da sua casa, pelo celular que você pagou com o seu dinheiro. Com um pouco de sorte, o que você pode ter é um desenho de um foguinho inanimado aparecendo na sua DM.
O foguinho, ao meu ver, é um assassino da interpretação de texto, de uma interação humana básica (feita com palavras) e, ainda pior: o comportamento é coveiro do olho no olho. Afinal, verdade seja dita, nenhuma mulher está muito interessada em um cara que manda um desenho aleatório — e com conotação sexual equivocada — como meio de interação. As mulheres só aceitam porque não tem muito mais por aí…
ROMANCE DE DORAMA
Com o estouro de popularidade que a cultura asiática — em especial a coreana — teve no Ocidente nos últimos tempos, ficou comum ouvir o tempo “romance de dorama”. Entre os pontos que são inclusos no tópico, temos o padrão “homem escrito por mulher” (que agora parece se adequar ao padrão Cha Eun Woo, basicamente), somado a clichês românticos sempre existentes. Curiosamente, um desses clichês é o do homem aparecer como passe de mágica para uma protagonista em apuros na chuva…
Se o guarda-chuva for amarelo, melhor ainda…
Em “O guarda-chuva azul” temos o melhor dos dois mundos. Sem a coisa do ídolo teen, claro, mas a paixão platônica visceral dos anos 2000 e com a chuva romântica coreana. Mas aqui temos um guarda-chuva azul se apaixonando por uma guarda-chuva vermelha. Tudo para que o casal humano se junte…
Quando assisti ao curta, me senti apaixonada pela ideia que completos estranhos ainda podem se apaixonar na rua, mesmo que de forma platônica. Mesmo que tudo pareça um desastre. (E não estou mesmo fazendo a mesma coisa desde que aprendi a escrever? Todos os meus livros são romances assim, afinal de contas.)
Finalmente um contexto atual de amor, feito para crianças, onde o Cupido não é um objeto inanimado, que funciona a bateria e que está sendo treinado por você — dia após dia — a te oferecer apenas o que te agrada e o que te conquista. Afinal, o amor é feito de pessoas, não de uma sequência de ilustrações digitais que podem ser, tanto uma receita culinária minimalista quanto uma atrocidade pornográfica.
“O guarda-chuva azul” é, provavelmente, o curta-metragem mais delicado que já assisti.
Olive Marie ♥